terça-feira, 28 de novembro de 2017

As cidades do vale no ciclo do café

Os barões do café, como ficaram conhecidos, tinham grande poder econômico e influenciavam diretamente na política aplicado dentro do país, um exemplo disso é o “Convênio de Taubaté”, política em que o governo comprava o excedente produzido nas fazendas de café para que o preço continuasse constante, fazendo com que os donos das lavouras não diminuíssem o lucro e a política do “café com leite”, que foi um acordo entre as oligarquias estaduais(Minas Gerais e São Paulo) junto com o governo federal, em que havia uma alternância de poder no cargo de presidente da República entre os políticos dos estados de São Paulo e Minas gerais.
As cidades do Vale do Paraíba foram muito prósperas nesse momento, uma das cidades visitadas - Bananal - era referência nessa produção e, por algum tempo, figurou como uma das cidades mais ricas do país. A economia dessa cidades girava em torno das grandes fazendas instaladas ao longo dos mares de morros, fazendas que exploravam a mão de obra escrava em larga escala, o que refletiu nessas cidades o maior contingente de escravos do Brasil na época.
Fazenda Pau D´alho- São José do Barreiro - SP (ao fundo é possível observar os mares de morros onde se espalharam milhares de quilômetros de cafeicultura)
Apesar dos tempos áureos, a monocultura e exploração excessiva de um solo sem os devidos cuidados tornaram a região cada vez menos produtiva. Essa situação, aliada à expansão das linhas férreas para o Oeste paulista - local com terras mais férteis - e à abolição do trabalho escravo, legalmente falando, ruiu toda a produção da região e, consequentemente, uma elite que ali vivia. Com um cenário totalmente desfavorável, essa elite se deslocou dessas terras deixando para trás imensos latifúndios inférteis e estagnando a economia de diversas cidades da região, que ficaram praticamente abandonadas.

O final do século XIX e início do século XX marcou a ascensão do oeste paulista na produção do café até 1929 quando, com a crise da bolsa de Wall Street, houve uma brusca queda no preço das sacas e muitos fazendeiros entraram em falência e consequentemente, a economia brasileira. O cultivo de café foi uns dos responsáveis pela concentração de riquezas na região Sudeste do Brasil e posteriormente o desenvolvimento industrial.

segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Areias e a negação do espaço público


Não conseguimos desenvolver plenamente nossa pesquisa referente ao patrimônio histórico da cidade, pois nos deparamos com o poder econômico e simbólico e a dependência que isso desenvolve, pois fomos impedidos de fazer qualquer registro da cidade. A Rede Globo de televisão se apropriou de todo o espaço público e cultural do município e impediu qualquer descoberta ou conhecimento sobre o espaço social de Areias. Notamos empiricamente, como geógrafos, o espaço público sendo negado pelo poder econômico, sabendo que nessa disputa de forças não teríamos qualquer chance. Avaliamos esse campo como um dos mais interdisciplinares e mais apropriados a uma crítica relacionada ao espaço geográfico.
Areias/SP - imagem retirada da internet, no dia essas imagens foram proibidas por conta do "cenário"

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

Fazenda dos coqueiros: História e reflexões

A fazenda foi fundada em 1855, pelo Major Candido Ribeiro e sua esposa Joaquina Maria de Jesus, com uma história bem diferente, pois os proprietários tinham um filho, com o apelido de Candoca, conhecido como o “Menino de Ouro”. A criança havia nascido muito doente e seus pais haviam realizado uma promessa, se o mesmo atingisse 15 anos de idade, doariam o equivalente ao seu peso em ouro à Santa Casa de Misericórdia. O menino sobreviveu, e em 5 de maio de 1883, foi agraciado pelo Imperador Dom Pedro II com o título de Barão de Ribeiro Barbosa. O Barão foi comandante do 6º Esquadrão de Cavalaria da Guarda Nacional de Bananal, juiz de paz, vereador, presidente do Diretório Municipal do Partido Conservador e presidente da Estrada de Ferro Bananalense. Além da fazenda dos Coqueiros, o barão também foi proprietário das extintas fazendas Rialto e Cachoeirinha. Dos tempos áureos, a Fazenda Coqueiros ainda preserva as senzalas, lavador e terreiro de café, moinho e móveis antigos, com os utensílios domésticos do século XIX e alguns documentos históricos como jornais da época e o banheiro mais luxuoso da época.
Casa Grande da Fazenda Coqueiros - Bananal/SP
Nos tempos mais atuais, a fazenda tinha sido dividida por partilha de bens entre os descendentes, para então, o Sr. Sinval da Silveira Brum, comprar a parte dos irmãos de sua esposa, reunindo toda a propriedade novamente. Este mesmo Sr. Era um homem muito rico e poderoso anos atrás, continha diversas lojas no Rio de Janeiro e na época da guerra, fabricou carros gasogênicos, acabando por ficar intoxicados por esses gases e morrendo em consequência dessa inalação. Nos dias de hoje a fazenda pertence à família Brum, mais especificamente Maria Elisabeth Brum Gomes e Antônio Augusto Ferreira Gomes que reside na mesma e é aberta para o turismo histórico, cultural e pedagógico, além do místico, que se desenvolveu com a demanda existente pois a religião dos escravos tem grande peso na região, sendo também um local de locação para diversos eventos e até casamentos pelos proprietários atuais.

Acerca de nossa visita, fomos recebidos pela Beth que toma conta da fazenda apenas nos finais de semana já que tem sua rotina na semana no Rio de Janeiro, contando com seu marido para tomar conta no restante dos dias, e que acaba por residir lá. De começo já notamos um amplo espaço na fazenda e com muito verde ao seu redor, de entrada já notamos as peculiaridades dos séculos passados, um lavatório para as mãos nem na entrada da casa, com uma essência de plantas. No interior claramente se nota que a estrutura do passado foi mantida, com algumas reformas realizadas pelos proprietários para que ela se mantivesse, diversos objetos e móveis da época, desde uma moeda própria da cidade na época próspera do café até objetos de tortura para escravos que não seguiam as regras e ordens de seu barão. Diante das histórias contadas por Beth e sua empregada principalmente, que assumia a maior parte da visita e era encarregada de nos mostrar os cômodos da fazenda bem como contar as histórias que a mesma continha, ouvimos desde a criação da fazenda até histórias tristes e de sofrimento, como de um quarto sem janelas e que só se abria por fora para manter uma tia da família que era extremamente doente e que acabara por passar sua vida inteira naquele quarto e fatalmente falecendo no mesmo, bem como uma “lenda” de uma escrava que havia sido enterrada no chão da cozinha pela sua patroa, pelo pecado de ter perdido um bebê na cozinha e sangrado um bocado durante uma festa de seu barão, para que servisse de exemplo.
Diante de tais históricas, por mais histórico e pedagógico que seja toda a estrutura e arquitetura da fazenda, fica difícil não se deixar afetar por tais histórias e na visitação dos locais que aconteceram as mesmas, um certo clima pesado acerca de tudo isso, e daí se parte uma reflexão, pois durante a nossa visitação, estava havendo uma comemoração dos advogados da cidade num complexo logo ao lado da fazenda com música alta e churrasco, visto que como dito acima, o local também é locado para eventos diversos, nos fazendo pensar como seria possível transformar um local que aconteceram tantos sofrimentos e histórias pesadas no passado em festa nos dias atuais?

Como mencionado pela própria Beth, na parte mística do turismo, diversas pessoas com diversas religiões e lugares fizeram visitas e constataram a energia pesada do local diante de tudo que aconteceu no passado, ainda nos dias de hoje, sendo que lindos quadros que estavam nesse complexo de festa e que retratavam escravos da época, foram pintados por uma senhora(moça?) que incorporava uma artista da época para fazer tais retratos.
De todas as histórias, artefatos, locais da fazenda que nós visitamos o maior questionamento pairou sobre isso, como celebrar em um local de passado tão triste? Que talvez se responda pelo fato de outras pessoas não terem refletido tão afundo sobre toda a história que está presente ali...

terça-feira, 14 de novembro de 2017

A cidade de Bananal

A cidade de Bananal foi fundada em 1783 e teve seu desenvolvimento econômico relacionado diretamente com a produção de café e a comercialização de escravos. A cidade chegou a possuir moeda própria e por possuir grandes riquezas, se tornou ponto local de hospedagem da coroa portuguesa.
Com a decadência do cultivo do café, a cidade entrou em decadência, mas as construções do período áureo do café continuaram na cidade e se tornaram patrimônio nacional. A falta de interesse na manutenção dos prédios por parte dos órgãos públicos gerou um abandono da cidade e utilizar a importância histórica da cidade para o incentivo do turismo e consequentemente a economia da cidade de Bananal.
Em nossa visita à cidade foi realizada uma entrevista com a dona Vera - antiga moradora da cidade e bastante envolvida nas questões culturais e de preservação da cidade - que nos apresentou o Solar Manoel Aguiar Valim e contou a história e os problemas que o espaço enfrenta e enfrentou para chegar ao atual estado de conservação, que está precário, mas que com a ajuda da cooperativa que comercializa artesanato na cidade foi possível realizar pequenas reformas no Solar. De acordo com o relato de Dona Vera, o Solar está atualmente "desativado" e conta com a ajuda voluntária dos moradores, pois a prefeitura não tem condições financeiras para a restauração do espaço, o que funciona em um dos espaços do solar atualmente é Associação de Artesanato que se mantém através de um regime cooperativo. Há interesse de que a Prefeitura de Bananal passe a funcionar no local, mas atualmente o casarão passa por uma situação de incerteza quanto ao seu destino e abriga alguns eventos esporádicos da Associação dos Artesãos.
Solar Manoel Aguiar Valim - Bananal/SP
Em campo, notamos que há diversas dificuldades para a preservação dos espaços históricos, pois a falta de incentivo e fiscalização acabam colaborando com a perda de memória no passar dos anos. A lei de fachadas evita o avanço da destruição do patrimônio histórico presente na cidade, por isso, há comerciantes que se sentem prejudicados com a lei das fachadas e são contra, como é o caso de algumas pessoas entrevistadas em nossa visita à cidade, questões que dizem respeito à "não-alteração" dessas fachadas acabam sendo empecilhos para a anexação de banners e placas nos estabelecimentos, por exemplo. Há uma situação contraditória na cidade no que diz respeito à conservação dos imóveis com fins de exploração turística e a "melhoria" de algumas estruturas no ponto de vista comercial e essa situação divide opiniões na cidade
Pharmácia Popular, a mais antiga do país - Bananal/SP
Estação Ferroviária de Bananal, Bananal/SP
Outros pontos de destaque, além do Solar Manoel de Aguiar Valim, são: a Phármacia Popular, que foi uma antiga farmácia imperial e foi fundada em 1830. Chafariz de Ferro que era um local para atender a população da cidade, que não tinha acesso à agua encanda, Estação Ferroviária de Bananal, que foi construída no período próximo à decadência do café e, como ramal de trem, não teve muita utilidade para a cidade, apesar de ser uma enorme construção, ao longo do tempo a Estação ganhou diversos usos e, infelizmente, quando visitamos a cidade, ela se encontrava fechada.

O vale e a preservação do patrimônio

Através de uma pesquisa prévia sobre o Vale histórico do Paraíba para o estudo do meio, observamos que seu patrimônio material é altamente preservado, essa constatação nos levantou uma dúvida de como a conservação se procedeu. A nossa primeira dúvida: provavelmente foi tombado, como será que foi esse processo? Como cidades que não possuem muito dinamismo econômico conseguiram preservar tão bem grande parte de seu patrimônio? Quais seriam as implicações de um possível tombamento no cotidiano dos moradores? Como conseguiriam sustentar essa preservação, haja vista uma série de dificuldades que isso traz, principalmente para uma população de mais baixa renda?
Essas foram as indagações que nos orientaram no estudo do meio, onde pretendíamos realizar entrevistas com os moradores e perguntar sobre as implicações do tombamento, o que achavam, como foi o processo, se tiveram impactos mais negativos ou positivos, entre outros.
Ao chegar no Vale histórico e interrogarmos alguns moradores acerca da preservação, soubemos que as cidades, apesar de reconhecidas como importante patrimônio histórico, não haviam sido tombadas, salvo algumas fazendas. A única norma de preservação de competência governamental era a Lei das Fachadas - Lei Complementar nº 1.66 de 2012, que é recente.

Então como foi possível a grande preservação do ambiente construído de uma cidade habitada, com pouco apoio e intervenção governamental?

Casa com fachada preservada e à venda - Bananal/SP
A Lei das Fachadas consiste na preservação apenas das fachadas das casas - sendo requisitado sua manutenção de acordo com a forma original - isso traz algumas questões, visto que, grande parte do patrimônio sob essa lei está em propriedades particulares; é necessário que se algo quebre, ou se desfaça com o tempo, seja reposto de acordo com a forma original e com o mesmo material, sendo de responsabilidade do próprio proprietário a manutenção do patrimônio. Isso gera custos e impede intervenções individuais.

Ao questionarmos alguns comerciantes e moradores, as respostas se dividiram em algumas dificuldades que isso gera e ao mesmo tempo do reconhecimento da importância da preservação, visto que uma das tentativas de dinamização da economia é o turismo.
Se pegarmos alguns exemplos de patrimônio histórico na própria cidade de São Paulo, observamos dificuldades e conflitos que isso gera com a população - principalmente pela forma como é implementada algumas leis de preservação, e que tem pouca ou nenhuma eficácia dentro de uma realidade de um lugar habitado em constante dinamismo, como é o caso de uma vila operária em São Paulo por exemplo, a Vila Maria Zélia, na região do Belenzinho, zona leste - a qual trata-se de uma vila histórica do século 19, tombada no início da década de 80, sem diálogo com a população ou auxílio para a preservação - o que resultou na praticamente completa descaracterização do local.

No entanto, as cidades do Vale do Paraíba, mesmo não sendo tombadas e com apenas uma lei recente de preservação, resistiram e muito ao tempo que se passou, e permanecem em grande parte preservadas.

Solar Aguiar Valim - Parte da fachada - Bananal/SP
Como? Mesmo se levantarmos sobre a questão do turismo, isso não seria suficiente, pois essa atividade econômica, se não for bem implementada, pode gerar diversos impactos e a consequente descaracterização. E, conforme as entrevistas realizadas, mesmo o turismo sendo uma grande meta para a economia da cidade, ainda é pouco dinâmico na região.

Permanece a questão que nos guiou durante todo o estudo do meio - então como permanecem preservadas?

Não é possível tecer certezas com apenas um estudo do meio, mas levantamos algumas considerações acerca do tema, a partir de levantamentos bibliográficos e a pesquisa empírica.

Para sanar algumas questões, tomamos como referência a tese de doutorado de uma professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Rosana Miranda, que defendeu a tese intitulada “Mooca: Lugar de fazer casa”.
Esta leitura foi essencial para compreendermos algumas nuances acerca da preservação que vão muito além da prática apenas institucional.
Em sua pesquisa, a autora defende que a preservação do patrimônio histórico do local se deu, principalmente, pela pobreza do local durante muito tempo, por não ser uma fração da cidade atrativa ao capital, “relegada” à moradia de pessoas mais pobres, fora do circuito de valorização urbana - e isso pôde, durante um bom tempo, manter o patrimônio histórico do local - ainda que deteriorado.

Podemos trazer essa perspectiva de forma profícua à realidade do Vale Histórico do Paraíba - inclusive até apelidada, mesmo com controvérsias, de “Cidades Mortas” - Isto é, a falta de dinamismo econômico na região, pouco atrativa para o capitalismo e com poucas atividades econômicas, de certa forma, “livrou” seu patrimônio de maiores impactos que poderiam ser produzidos por um maior dinamismo econômico, a despeito do respaldo institucional acerca da preservação.
O “esquecimento” de um local pelo capitalismo e a pobreza resultante, nos revela um elemento de preservação do patrimônio. Isso porque, além de não haver atividades que geram mais impactos, que exigem transformações do território para a fluidez do capital, também tem o fator de haver menos geração de renda para a própria população, que eventualmente poderia realizar obras em suas propriedades, descaracterizando o modelo original, como aconteceu na Vila Maria Zélia em São Paulo, por exemplo.
A responsabilidade pelo tombamento no estado de São Paulo é do CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo)